“Menos carro, mais bicicleta!”
Segunda-feira, penúltimo dia do festival. Não me lembro da manhã, mas acho que dormimos até perto do meio dia. Depois banho, almoço e etc. Palco do Sol, 13h30minh e Plá, o cantor folk que é marca registrada do Psicodália com seu estilo ‘messiânico’ de ser, começa sua apresentação. Faço algumas fotos e depois convido a Liza e vamos nos sentar num quiosque de nome sugestivo: ‘Adega do seu Dionísio’, onde se vendia vinho e estavam alguns amigos bebendo. De lá, ficamos de frente pro palco, vendo e ouvindo de longe a apresentação do Plá. Músicas já conhecidas do público do Psicodália e outras novas. Plá tem muita música. Uma delas manifestava: “Menos carros, mais bicicletas!”, depois: “Menos lata, mais gente!”, algo assim. Plá é um cantor do tipo ‘militante’. E o público reagiu e cantou junto em tom de manifesto. Nisso, Plá relembrou o fato daquele motorista que em Porto Alegre-RS, atropelou vários ciclistas que manifestavam pela diminuição do carro a motor nas ruas em prol das bicicletas. Oportuna essa atitude do Plá, respondida a altura pelo público. De longe curti este momento, um pouco satisfeito por ainda existir este tipo de atitude, que, por mais simbólica que seja, é o uso da arte, do microfone, para uma crítica a favor de uma possível transformação sociocultural dos valores humanos e urbanos. Aplausos para o Plá!
Adega do Seu Dionísio
Plá!
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No final da apresentação do Plá voltamos para frente do Palco do Sol, e em poucos minutos lá estava ele, O Lendário Chucrobillyman. Um show que eu esperava muito ver. E o que vi senhores e senhoras, foi algo estridente (no sentido de mexer com a cabeça e o corpo). Chucrobillyman é o Koti, um ‘monoband’ (banda de um homem só), que toca bateria com os pés, violão-slide distorcido, canta, toca harmônica e uma espécie de cone, como uma corneta. Tudo coordenado e muito criativo. Um figura de estilo, meio torto e solitário em cima de um palco fazendo algo entre o rockabilly, country-rock, blues e garage rock. Espetacular! Botou o público pra dançar. “Tô locão!”, volta e meia ele largava. “Como vocês... tô loco!”, continuava. Arrancava risos do público devido a sua performance e seu modo de expressar, além de mandar timbres e um estilo pessoal de tocar e cantar. Algo muito original e bom de se ver e ouvir. Tenho certa afinidade com figuras e sonoridades assim. Uma estética visual e sonora que muito me agrada, por isso posso dizer que foi uma das coisas mais geniais que pude ver ao longo das cinco edições do Psicodália. Na próxima, quem sabe ele esteja no Palco do Pasto, merecidamente. Com sua simplicidade meio punk, quebra um pouco com a ‘complexidade’ progressiva de parte das bandas do festival – questão de diversidade. Show divertidíssimo e com uma proposta diferenciada, além de original. Presença de palco caótica. Pura atitude que traz à tona a ‘marginalidade criativa e sonora do rock primitivo’. Depois da sua apresentação, eu e a Liza fomos pra trás do palco conversar pessoalmente com o Koti. Lá estavam também alguns componentes da banda Os Monumentais que tocam com o Rafael Castro e da banda Os Penitentes que tocam com o Koti. Presenteamos o Koti com um livro que tem alguns contos meus e alguns poemas da Liza e batemos um papo com aquela gente que é da nossa laia. Antes de posarmos pra uma foto, percebendo minha camiseta do velho Buk, Koti enfatizou: "Esse é de respeito, esse é de respeito!". Dá-lhe Chucrobillyman, o lendário!
O Lendário Chucrobillyman!
Os Monumentais, Os Penitentes, Koti (O Lendário Chucrobillyman), eu e Liza.. seção de fotos para uma revista colírio..
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Em seguida subiu ao palco a banda Cosmo Drah, a qual não pude prestigiar por necessidades básicas e primárias. O pouco que pude ver/ouvir, não me dá condições para comentários. Intervalo entre os palcos e a expectativa da coletiva de imprensa com o Tom Zé. Alguns minutos de espera e a informação de que a coletiva seria no Saloon. Fomos pra lá, e enquanto eu estava no banheiro, Tom Zé entra no Saloon e cumprimenta de mão em mão todos os jornalistas e demais pessoas presentes no local. Haviam me dito que às vezes ele era ‘meio chato’ nas entrevistas, e então eu esperava por isso. Mas o contrário do que eu havia ouvido por mais de uma boca, Tom Zé foi muito compreensivo e querido, além de brincalhão, pelo menos ali naquele momento. Uma figura genial! E o que eu já sabia se confirmou. Tom Zé é um mestre! Um ícone da cultura e arte literária e musical no Brasil. Um artista da palavra. Depois da coletiva e de um papo informal nos bastidores, passei a admirar ainda mais esse baluarte da nossa cultura. Só vendo e ouvindo pra crer! 74 anos de idade e uma disposição tão jovem! Tom Zé é uma criança num corpo esguio de velho. Não de um velho decadente, mas de um velho vivaz. Existe mais juventude em Tom Zé do que na maioria dos jovens que eu conheço. Fala e se move a todo o momento. Ao mesmo tempo é complexo, intelectual e simples, direto e ingênuo. Mas de uma ingenuidade criativa, fabulosa, literária, infantil. Dono de uma linguagem magnífica, a um só tempo regionalista e universal. Poucas perguntas e muitas respostas. Tom Zé fala pra cacete! Mais do que eu. Simpático e genioso, em seus gestos e palavras demonstrou carinho ao povo do Sul. Comentou que adorava o sotaque alemão-gaúcho como o meu. Alemão por causa do meu nome, creio. Decerto, relacionou meu nome que é de procedência alemã ao meu sotaque carregado. Falou sobre a condição do cantor nos tempos da ditadura, criticando parte dos artistas da época que ‘viviam da censura’: “Era comum o discurso cultural contra a ditadura”. Falou da língua e suas transformações e diferenças, de região a região do país: “Cada língua é uma visão de mundo”. Pra mim que também trabalho com linguagens, foi uma aula. Depois de um papo alegre, foi só esperar pelo que viria mais a noite.
Coletiva e bate papo com Tom Zé
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Não demorou muito e as apresentações do Palco do Pasto iniciaram com uma das bandas que eu mais queria ver. Tenho três discos dessa banda que ouço e gosto muito, pela inteligência e bom humor das letras e a criatividade das músicas. Rafael Castro e Os Monumentais fizeram uma baita apresentação. Me lembra algo de Mutantes, fase Arnaldo Baptista. Um show bem original e peculiar. Rafael Castro canta muito bem com o grave da sua voz afinada e ressonante. Estava um pouco zonzo de trago e ainda tocado pela conversa com o Tom Zé, mas mesmo assim deu pra curtir o showzão de Rafael Castro e Os Monumentais.
Rafael Castro & Os Monumentais
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O Sebbo (outra banda tradicional do festival) foi a próxima a se apresentar. Numa conversa antes do show no restaurante com meu xará Herman (guitarrista e vocal do Sebbo), já soube antecipadamente da sua volta à banda. No ano passado, Herman havia saído do Sebbo, o que, de certo modo, deu uma quebra no estilo e sonoridade da banda. Mas com o seu retorno, a banda retoma sua formação ‘clássica’, que tem no trio frontal: guitarra, teclados e vocais, sua maior potência. O Sebbo fez um show muito bom, muito entrosado e com a ‘velha’ e boa sonoridade que caracteriza a banda. A vocalista Maga também cantou mais centrada e o show foi uma beleza por isso. Fiquei feliz, pois é uma banda muito boa e dona belas composições.
banda O Sebbo
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Para anteceder o show do Tom Zé, subiu ao palco a banda, também tradicional no festival (e que um dia já se chamou ‘Gato Preto’), Confraria da Costa, do grande vocal, flautista e performance Ivan. Desde a primeira vez que vi/ouvi a Confraria, quando ainda era a Gato Preto, gostei. Uma banda de atitude e com letras e uma estética de palco e performance festivo-caótica, que me dizem muito respeito. Literatura de pitara nas letras e sonoridade característica. Me lembra muito um estilo que eu adoro, o ‘Gipsy Punk’, característico do Leste Europeu, com bandas como Gogol Bordello e No Smoking Orquestra. Apresentações sempre anárquicas e divertidas. Difícil é ficar parado nessa orgia musical. Confraria sempre foi pra mim um dos pontos altos do festival, e novamente, a banda repetiu a dose. “Garrafas pro ar marujos!”.
banda Confraria da Costa
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Tom Zé dá o tom!
Energia a toda por causa do show da Confraria da Costa, e não demorou muito quando anunciaram uma das atrações mais esperadas do Psicodália. Tom Zé sobe ao palco com uma energia contagiante, e do início ao fim do show, foi assim. Tom Zé não para. Canta, pula, dança, fala, gesticula, brinca, provoca, conclama, transforma. Confirmada minha expectativa. Esguio, porém forte nas suas movimentações no palco, Tom Zé ensinou que a idade não é o caso (neste caso, ou no caso dele). Um apanhado de parte de sua carreira foi possível ver e ouvir ao vivo, num espetacular show, performático e musicalmente amplo. Que estética! Que sonoridade! Que banda a banda que acompanha Tom Zé! Timbres e maneiras de se pensar a música e os caminhos do som. Coisa louca! Oras tensa e pesada, oras suave e sutil. Complexa mas sem perder a simplicidade, a direção. Tudo muito criativo, original e genial, como seu maestro. E Tom Zé é um maestro (ou mestre). Um dos grandes compositores vivos da música brasileira. Rock, baião, sons difusos e confusos, caos sonoro, tudo dentro da técnica e com feeling. Tudo musicalmente abrangente. Pura linguagem. Fora e dentro do palco, Tom Zé é professor, é mestre, é gênio. Na música e na palavra. Só vendo e ouvindo pra saber. Um dos mais alegres contatos artísticos que tive, um dos grandes shows que vou recordar nesse tempo de músicas empacotadas e discursos simplistas em torno de coisa nenhuma. Tom Zé é a contradição disso tudo, no seu jeito, na sua música, em si. Tom Zé tem estrada atrás de si, mas se recria a cada apresentação, o que o torna sempre contemporâneo, o que o torna sempre inusitado e intenso.
Tom Zé & banda
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Terminado isso que vai além de um show musical, arriscamos outra vez entrar no Saloon, e outra vez, não foi possível. O Saloon fervia. Então, novamente, fomos pra barraca. Da barraca ouvimos o samba que corria solto no Saloon. Até começou bem, com sambas mais toleráveis, alguns até de raiz. Mas depois o nível baixou, e muito! Samba e pagode mais pop, alguns até medíocres (aqueles grudentos que vinculam nos programas de auditório da rede globo). Ainda bem que o cansaço era tanto que eu desapareci na batucada. Um pouco de ‘poluição’ no meio de tanta coisa boa. Infelizmente! – e não venham me dizer que isso é preconceito da minha parte! Se ainda fosse samba de terreiro ou de morro... Mas, tem ‘gosto’ pra tudo não é? Ainda mais quando o trago sobe pra cabeça. Talvez, eu é que seja muito cético pra isso. Talvez...
Continua...
6 comentários:
SUPER MATÉRIA!
BAH FICOU MUITO MASSA !!
...ESPERANDO A CONTINUAÇÃO!
Ducaraio mesmo! Nada de frescura nem formalidade. Fotos belíssimas também!
Parabéns pela reportagem, Hernani!
Menos carro!
Mais bicicleta!!
viva o Plá!
Viva o Psicodália!
Parabéns pelos textos e fotos..
abraços!
O Lendário Chucrobillyman!
...um dos melhores!
proposta diferente..
e viva o islaide ou slade!
hehe
M.A.R.A.V.I.L.H.A!
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