Lembro do nome de Flávio Basso ainda criança, ou
pré-adolescente, no final dos anos oitenta quando comecei a ouvir rock. E uma
das primeiras bandas nacionais que ouvi e gostei foi a banda gaúcha TNT, do qual Flávio era membro fundador,
dividindo as composições com Charles Master. Cansamos, na época, eu e o Gugo (que
era meu vizinho de muro e se tornou meu parceiro de primeira banda), de aos
domingos pela manhã sentar no sofá da sala da sua casa com seu tio, o ‘tio
Carlo’, e ouvir suas ‘estórias’ engraçadas, abastecidas de uma doce caipirinha
que, volta e meia, nos permitia darmos uma bicada. Entre discos de vinil de
sertanejo’80, lá estava ele, o disco do TNT. Ouvíamos muito, até decorar as
letras e brincar, literalmente, de tocar as músicas.
Passou algum tempo e então conheci Cascavelletes e logo fiquei sabendo que Flávio Basso cantava nesta
banda. Chegaram os anos 90 e gravei (copiei), não me lembro de quem (se não me
engano dos ‘açougueiros’, uns amigos que fiz naqueles anos por causa da paixão
de ambos pelos Ramones, ou do Paulo
de Nadal, que foi baixista da Repolho, que na época também era chamado de
Girino) uma fita de vídeo (VHS) que abordava o rock gaúcho dos anos 80. Se chamava
‘Vortéx’ (material que tenho até hoje), produzida por Carlos Gerbase (hoje
cineasta) que, na época, era baterista dos Replicantes,
uma das bandas nacionais que mais ouvia e gostava, tanto que com minha primeira
banda, fazíamos cover dos Replicantes e do Sangue
Sujo, ambas bandas com o Wander Wildner nos vocais (outro nome importante
do rock do sul e do Brasil, que anos depois viria a regravar um dos maiores rits do Júpiter: ‘Um lugar do caralho’.
Nesta fita, acho que foi que vi pela primeira vez a imagem em movimento dos Cascavelletes
e do Flávio Basso em ação, com sua voz e jeito de cantar peculiares. Mas também
lembro de uma música dos Cascavelletes que a gurizada cantava nos anos 80 que
se chamava ‘Nega Bom-Bom’, e que foi tema de uma novela da Globo na época.
Passou o tempo e surgiu no cenário do rock independente do
sul um tal de Júpiter Maça. E lá
estava ele! Flávio Basso agora era Júpiter Maça, com seu fabuloso disco ‘A sétima
efervescência’. No começo, confesso que o disco não me encantou muito, pois
estava numa fase de ouvir praticamente quase só punk rock e hardcore. Mas, aos
poucos, ouvindo uma canção aqui, outra ali, o disco me conquistou e a
psicodelia voltou com tudo na minha alma musical. Tanto que, tive a
oportunidade de assistir ao vivo Júpiter Maçã na época, no Guará, um clube
recreativo que mais tarde o CRC (Clube Recreativo Chapecoense) comprou. Eram meados
dos anos 90. Anos depois, também assisti a banda no ginásio do SESC. E quanto
Júpiter tocou no Acústico Pub, no alto da Getúlio Vargas, eu estava lá fora,
assim como, quando tocou no CRC, bem no centro da cidade. Não entrei, não sei por
que, mas estava por perto e ouvindo (risos).
Vi/ouvi ao vivo mais algumas vezes Júpiter, só que como
Apple. Mas foi numa rua do centro de Porto Alegre, em uma das minhas idas pela
cidade, anos atrás, onde eu e Liza caminhávamos, que conhecemos pessoalmente o
Flávio (ou Júpiter). Estava, na época, acompanhado de uma garota, sua
companheira que, se não me equivoco, tocava com ele no período. Sentado em uma
mesa de bar (ou era um café?) pelo lado de fora. Paramos em frente a mesa e
fomos bem diretos. Saudamos o Júpiter e dissemos que éramos de Chapecó e o
quanto admirávamos a sua obra. Ele retribuiu com muita simpatia e generosidade.
Mas como estávamos de passada, foi um breve, porém, alegre diálogo. Depois disso,
encontramos e conversamos com Flávio em Chapecó e, pela última vez, no
Psicodália do ano passado, onde registramos o show em fotografias e
participamos como imprensa externa do festival, da coletiva de imprensa com o
Júpiter. E para quem não pôde ver, um extraordinário show! Ali Júpiter fez um
apanhado da sua carreira em versões dos seus clássicos como nunca havia ouvido,
e provavelmente, como nunca ele havia feito antes, além das intensas canções
mais recentes e novas. Sem titubear, um dos grandes shows que vimos, dentro destes
9 ou 10 anos que vamos ao Psicodália. Um show histórico que carimba o fato de
que, Flávio Basso ou Júpiter Maça, ou Júpiter Apple, é uma figura singular, rara,
uma das mais importantes da história do rock, não só gaúcho, mas do sul e do
Brasil.
É com certa tristeza que deixo registradas estas minhas
palavras, pois o pouco que conheci do Flávio pessoalmente, pude perceber a
pessoa que ele era atrás dos palcos e ‘personagens’ que ele mesmo criou ou fez
de si. Sendo que, o maior de todos eles, foi ser ele próprio. Um artista
genioso que fazia realmente aquilo que sentia e sabia fazer, sem tirar nem pôr.
Na real, penso que Flávio (ou Júpiter), foi aquilo que, senão todos, pelo menos
a maioria dos rockeiros um dia quis ser: Uma ‘estrela do rock’ independente dos
vínculos e interesses das mídias de massa. ‘Estrela’ no sentido de ter brilho
próprio, que, além do nome do homem, cintila, reflete e ecoa nas suas canções.
Uma abraço, boa viagem e obrigado Júpiter Maça, Júpiter
Apple, Flávio Basso!
Aplausos para Júpiter!