Festival Psicodália de carnaval 2009 : um apanhado geral...
Nas minhas andanças pelo mundo da arte e/ou da cultura-contra-cultura, sempre procuro crescer, de uma forma ou de outra. Insatisfeito, sempre estou em busca de novos conhecimentos e experiências. Dentro disso, já fazem três anos consecutivos que vou, junto a amigos e afins, ao “Festival Psicodália de carnaval”, que acontece em São Martinho – SC. No ano de 2007, o festival já havia me impressionado pela qualidade das bandas e pelo som (muito apropriado), pelo belo local (uma chácara, localizada n’um grande vale, com muito verde, cachoeiras e tudo mais), e pelo público, um povo alegre, pacifico, disposto a compartilhar e trocar conhecimentos. No ano seguinte de 2008, o festival havia crescido, e muito, em tudo. Maior estrutura, mais público, mais organização, evolução musical por parte das bandas. De um ano para o outro, tudo se superou, e o que já era bom, ficou ainda melhor. Em 2007, as atrações principais foram ‘Rolando Rock’ (projeto bem sucedido do Rolando C. Júnior, baterista da Patrulha do Espaço), e o Mutante ‘Sergio Dias’, quando o palco ainda era menor, mas os shows não menos grandiosos. No ano de 2008, foi a vez da banda ‘Casa das Máquinas’ fazer seu espetáculo, já no palco novo, um palco maior e com um som também maior e de melhor alcance/qualidade. Chegou 2009, e o festival seria prioridade novamente nas férias deste que voz escreve, e foi. Conversava com o Yusanã, do site ‘Agenda Chapecó’, na possibilidade de irmos cobrir o evento: fotografar, entrevistar, escrever textos sobre (como este), etc. Mas Yusanã não pode, e lá fui eu. Algumas fotos de algumas bandas foram tiradas, já que de todas não foi possível e nem seria viável por no site, ou falar de cada uma e suas particularidades. Vou então aqui, brevemente, destacar algumas bandas que vi e de que me lembro e o festival como um todo.
Chegamos ao Psicodália 2009 pela manhã, bem cedo, creio que lá pelas 7 da manhã. A viagem de ida durou umas 10 horas. Fomos devagar e paramos para comer na estrada e tudo mais. A parada para apreciar um pouco da beleza e imensidão da ‘serra do rio do rastro’, foi inevitável. Um obra de arte da natureza, indescritível. Andamos mais um tanto e lá estávamos nós. Alguns minutos parados esperando abrirem os portões, depois o credenciamento dos participantes e fomos liberados para achar um local para erguer acampamento. Acampamos no alto de uma montanha com uma vista formidável. Entre banhos de córrego, cachoeira e chuveiro, boa comida, bebidas diversas e afins, a convivência por lá foi muito boa. Como já disse, pessoas de diversos lugares dispostas a conhecer e se relacionar com ‘o outro’. Já nos palcos, música, música, música... Dois palcos faziam o rock acontecer. O ‘palco do Sol’ era onde tocavam as bandas á tarde, e ficava em frente às duas piscinas de pedra, onde o povo se juntava para relaxar, se banhar, se conhecer e ouvir um bom som. Destaco neste palco, algumas bandas que me chamaram muito a atenção, das que pude ver. Logo ao chegar no ‘palco do Sol’, a banda “Trem Fantasma” (PR) passava o som. E que passagem! Tocaram além de músicas próprias, um Cream e um Slade, duas bandas que gosto muito. Aquilo me empolgou. Deusdocéu! Sem comentários! E quando começaram a tocar p’ra valer então... O mundo parou por alguns minutos. Um trio literalmente ‘power’. Composições próprias muito boas e uma presença de palco muito boa, além dos timbres vibrantes. “Seres Inteligíveis Vindos do Hiperurano” (PR), foi outra banda de que gostei. Já conhecia esta da edição 2007. Uma das bandas mais progressivas de todo o evento. Destaque para os teclados e composições muito bem arranjadas. “O Conto” (PR) foi outra banda das que mais me fez vibrar. Um trio também (guitarra, bateria e teclados), e ‘power’, como não! Um dos grandes guitarristas e vocais do evento, fazendo frente com um dos grandes tecladistas também. Composições e timbres intensos, que oras me fizeram lembrar Pink Floyd na sua fase mais inspiradora. Belos solos e improvisos! Outra banda deste palco de que devo falar, é a “Mesa Girante” (PR). Banda muito boa, que fez sua estréia no festival do já conhecido guitarrista, meu xará Hermann, da banda “Sebbo”. A banda lembra algo entre Mutantes, Tutti Frutti e Deep Purple. Destaque para o baterista, as linhas de guitarra e baixo, a vocal feminina que fazia coro com as vozes masculinas, e o tocador de harmônica, ‘um monstro!’ Agora vamos para o”palco do Pasto”, o palco grande, noturno. A princípio, destaco o melhor som pra rock que já ouvi até hoje. Em 2008, o som já foi muito bom, e desta vez, melhor ainda. O som valorizou os timbres e as peculiaridades de cada banda, cada instrumento, de cada músico. Técnicos e equipe realmente profissionais. Tocar com um som assim é um sonho! No ‘palco do Pasto’, ainda no sábado, a primeira noite, para iniciar o espetáculo, e começou com tudo, subiu ao palco a banda “Plástico Lunar” (SE). Esta banda nordestina, mostrou para quem lá esteve, que o rock psicodélico com elementos de garage rock e muito experimentalismo, ainda é vivo, e muito vivo! Uma das bandas de que mais gostei de todo o evento. Simplesmente um show explosivo, com uns 15 minutos de sintetizador queimando neurônios desavisados no meio da apresentação. Chegou a cair a luz do local que demorou mais uns 15 min. para voltar, uma loucura. Esta banda tem um baixista de outro mundo, um tecladista/órgão/sintetizador infernal, um baterista que voa, guitarras criativas e experimentais e belos vocais, sem falar na energia típica do garage. Em suma, “uma baita banda!” E a noite estava apenas começando. Outra banda que destaco neste palco, novidade no festival também assim como a ‘Plástico Lunar’, e que foi a última a se apresentar na noite, foi a banda “Zé Trindade”. É vendo que se aprende, pois subestimando o nome da banda, achei que tratava-se de um cantor solo e tal, como o Plá (não tirando seu mérito), mas não foi nada disso. “Zé Trindade” (MG), de Belo Horizonte, fez a noite no ‘palco do Pasto’ terminar com vontade de ‘quero mais’. Um trio, ‘power’, e o que dizer a mais do que isso? Três instrumentalistas de primeira com um som nervoso e muito bem composto. A banda mostra que o rock ainda é atitude, timbres, vontade se fazer e ser. O baterista deu seu show a parte, junto ao baixista, uma das melhores cozinhas de rock que já vi/ouvi ao vivo. O guitarrista virtuoso mas sem perder o feeling, muito pelo contrário. A banda lembra o peso do Grand Funk, a técnica do Rush, a atitude do Rage Against the Machine e presença de palco do MC5, por aí... só para ter uma referência de leve (usem a imaginação). Tudo isso com as belas composições e letras. Um pé nos anos 70 e outro no hoje-aqui-agora. Um espetáculo!
Domingo, o calor aumentou e o dia foi dentro da água, e que água! Diversão refrescante! Já a noite, iniciou com a bela apresentação da já conhecida por nós, “O Sebbo” (PR). Banda com canções muito boas, um tecladista criativo, guitarra ‘a la Blackmore’ ferrada, baixo sereno, três vozes que se complementam, sendo uma feminina (e muito boas), e um ‘demolidor’ na bateria, simplesmente. Uma bela apresentação de uma das bandas mais reconhecidas no festival. A próxima banda a subir ao palco é uma das minhas prediletas: “Sopro Difuso” (PR). Destaque para o conjunto vocal, flauta (arranjos no lugar que eles merecem estar), guitarra ‘floydiana’ que eleva a alma, e principalmente composições (letra/música). Minha emoção foi tanta que comentários não serão suficientes para descrever tal momento. Quando falei com os caras, não disse parabéns nem nada disso, apenas agradeci com um ‘OBRIGADO!’, recebi agradecimentos e abraços, e minha noite foi boa. Na seqüência, a “Gato Preto” (PR), também fez sua parte. E nesta, não consegui nem tirar fotos, pois dancei-pulei-enlouqueci no meio da multidão, do início ao fim, nos divertimos como a tempos não acontecia. Canções de pirata fazem da banda algo típico para se liberar, pular e cantar bebendo rum. Uma grande banda, com músicos de primeira e belas composições. Destaque para a guitarra jazzística, a bateria detalhista, o violinista (um figura!), e o vocal/flautista, que detona (também uma das bandas mais conhecidas do público e ‘tradicionais’ do festival). Logo subiu no palco uma das atrações ‘principais’ do evento, a banda “Pata de Elefante” (RS). Um grande show instrumental. A banda toca muito! Um trio, ‘power’, denovo? Sim, outra vez... grandes músicos com grandes composições. Já havia visto a banda antes em Passo Fundo, mas desta vez a coisa foi maior. Destaque para um ‘The Who’ instrumental que rolou, e a virtuose dos guitarristas. Uma noite entanto que me deixou desconcertado e muito feliz.
A segunda amanheceu nublada, com o sol um pouco envergonhado entre as nuvens. Logo mais, o sol resolveu brilhar e fritar o mundo abaixo dele. Que calor! Quase tive um treco. Mas na tarde, a chuva veio, e com ela uma tempestade que levou lonas e roupas estendidas. Coisa linda, ainda mais para nós que estávamos no alto de uma montanha. Aquele céu negro que roncava. Começou um chuvão com raios, e dormir foi uma boa opção naquele contexto. Acordamos depois de algum tempo, preparados para a noite que viria. A garoa não parou mais, mas em compensação, refrescou bastante. Segunda foi a noite da atração ‘principal’. A lendária banda “Som Nosso de Cada Dia” faria sua apresentação. Vou destacar nesta noite fantástica, uma banda feita por palhaços, literalmente. A “Bandinha Di Da Dó” (RS), era realmente de ‘dar dó’, pois os bichos detonaram. Quatro palhaços magníficos, que brincavam com o público e com a música. Gaita (acordeon), guitarra, baixo e bateria, além de um instrumento inusitado, cheio de apitos e outros sopros. A banda avacalhou com a pretensa seriedade do mundo musical intelecto-fechado, no sentido de tornar tudo mais simples e igual, tudo mais acessível. A musicalidade complexa e doida da banda, lembra em partes ‘Gogol Bordello’ e ‘Goran Bregovic’, assim como “Gato Preto”. Com uma postura anárquica e uma musicalidade circense e desregrada, o show foi muito divertido e humano. Palhaços das oficinas invadiram o palco no fim da apresentação e fizeram o maior auê! Muito bom! Depois foi a vez da “Trupe Sonora Casa de Orates” (SC), a única banda catarinense. A banda é uma das mais conhecidas e ‘tradicionais’ do evento, e mescla teatro com música. Destaque para a indumentária do grupo, além da performance teatral da vocalista/atriz. A última música foi um hino a altura do festival e fez todos se sentirem mais vivos num mundo que não valoriza tanto a produção o quanto devia: ‘Ode aos que produzem!’
Alguns minutos se passaram e lá estavam eles, o “Som Nosso de Cada Dia”. Já à tarde quando chegaram no local do evento, havia trocado uma idéia com um dos responsáveis pelo retorno da banda, o Marcelo Schevano, guitarrista também da Patrulha do Espaço. Neste papo ele me falou da volta da banda e das canções inéditas que iriam tocar no festival. E foi o que eu vi. E o que foi aquilo? Ainda estou tentando voltar em mim para compreender. Começando pelo tecladista que acompanhou ‘o mestre Manito’, o cara toca demais. Depois o baterista, nada mais, nada a menos do que o batera que foi da banda ‘Terreno Baldio’, um clássico progressivo brasileiro. Dois vocais magníficos (um era um garoto), faziam as vozes altas e técnicas que o Pedrinho, baterista e vocal já falecido, deixou registrada nos discos da banda. A guitarra ficou por conta do Marcelo, um grande guitarrista e fomentador do rock neste nosso momento atual. No baixo e vocal, um dos ícones compositores e músicos do rock progressivo brasileiro, o Pedrão. E para completar esta ‘seleção’, ele, o mestre Manito. Manito foi tecladista e sax da lendária banda ‘Os Incríveis’, do baterista Netinho, fundador que na edição passada do festival tocou com a ‘Casa das Máquinas’. Manito já tocou também com os Mutantes e outros. O show... não, não, o espetáculo, começou com uma das composições inéditas. Em seguida o instrumental ‘O Guarani’ de Carlos Gomes (aquele da abertura da Voz do Brasil). Logo em seguida os clássicos da banda, e o público acompanhando. Aproximadamente 2.500 pessoas, creio eu, cantando ‘Bicho do Mato, Sinal da Paranóia, Pra Swingar, etc.’ ‘Bicho do Mato e Pra Swingar’, foram tocadas novamente no ‘bis’ da apresentação. Tive que conter as lágrimas ao ouvir - e para poder cantar junto - a música ‘Sinal da Paranóia’. Depois, na conversa nos camarins, a simplicidade dos músicos e o diálogo de ‘igual para igual’, deixou evidente o que foi uma mostra do que ainda existe no mundo da música: honestidade e troca. Manito é um ser indescritível, tanto dentro como fora do palco. Um mestre de pequena estatura e grande virtuosismo! Nunca havia visto/ouvido algo parecido atrás dos grandes teclados e órgãos Hammond, do saxofone e da flauta transversal. Um verdadeiro show de rock progressivo com levadas de funk/soul e ‘música brasileira’, que transportou quem pode ver/ouvir aquilo, a um mundo ainda inabalável. Fiquei literalmente de ‘boca aberta’!
Chegado o ultimo dia, terça feira, e a vontade de continuar lá e ouvir e ver aquilo tudo, aumenta. Os momentos de alegria em saber que hoje ainda existe o bom rock, a boa música, a boa relação entre produtores, artistas e afins, em eventos como o Psicodália que traduzem isso tudo. Desarmar acampamentos abaixo de chuva, com aquela vista, lá no alto, o corpo cansado e a mente liberta, tudo é experiência, e naquele momento aquilo era importante. Carregamos tudo na van e perdemos um pouco das bandas que tocavam no ‘palco do Pasto’, as últimas do evento. Mas ainda veríamos uma, muito esperada por mim, diga-se de passagem. Subiu ao palco, antes do Plá (figura carimbada e já conhecida por todos do evento), a banda ‘Cadillac Dinossauros’. Uma banda que leva no seu som o peso das bandas de hard rock setentista, o embalo do funk/soul, com rif’s ‘a la Sabbath’, e muita genialidade. Sons dissonantes e com técnicas apuradas, também fazem parte da sonoridade da banda. Algo de bem peculiar é o vocal com seu agudo e malandragem. Um grande vocalista que também manda bem na guitarra, dono de um timbre de voz que caracteriza a banda e uma presença de palco e indumentária que complementam um todo: um guitarrista solo dono de belos rif’s, um grande baterista que faz tremer o palco, e um baixista dos melhores que já vi, compõe o resto do plantel desta grande banda, para tudo terminar bem. Subimos na van com o Plá tocando no palco e encerrando o festival, e o que ficou para sempre, foi a certeza de que muito ainda é possível quando se tem vontade para tal, quando cabeças pensantes se reúnem para dar continuidade a algo grande e verdadeiro. Uma troca de 4 dias de conhecimentos, relações humanas e com a natureza, uma escola de música ao ar livre onde se transpira sons e vibrações (literalmente), com workshops, oficinas, e tudo mais.
Isso foi e é o Psicodália. Parabéns ao movimento e, como eu declarei ao ‘Sopro Difuso’: OBRIGADO!
Herman G. Silvani (Niko)
2 comentários:
uma grande iniciativa escrever sobre o festival!
parabéns!!
belo texto!
muito foda as bandas mesmo! melhor festival de rock q já vi. Som nosso é mesmo foda!
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