quinta-feira, março 01, 2007
Psicodália: viver o rock, respirar música e beber a amizade...
Saímos de Xapecó, deixando para trás o medíocre carnaval de clubes e elites, esquecendo-nos da hipocrisia do ‘tolerância zero’, enfim, decolamos. Eram aproximadamente 21h de sexta, pegamos a estrada rumo a São Martinho, Serra do Tabuleiro - SC. Foram aproximadamente 13h de chão. O ônibus, ‘não sei porque diabos’, parava a cada hora e meia. Depois de descermos a magnífica, chapante, linda, maravilhosa ‘Serra do Rio do Rastro’, a qual proporcionou-nos uma das mais lindas paisagens (talvez a mais linda – e por sorte, chegamos lá no alto com o sol nascendo entre montanhas e nuvens – maravilha!), chegamos ao não menos lindo local onde a psicodelia fez sua estada. Um vale cercado por montanhas e matas, cortado por riachos fartos de peixes... só estando lá para realmente saber.Primeiro dia e o calor seria insuportável não fosse o belo local e as atrações. Para refrescar-nos banhamo-nos em um riacho de águas límpidas, junto aos peixes que eram visíveis e abundantes. No local, além dos riachos, haviam duas deliciosas piscinas de pedra onde viventes banhavam-se alegremente, além da cozinha comunitária, onde era só levar algo para comer e compartilhar o fogo e a alimentação. E por falar em alegria, que dias mais alegres e tranqüilos. O povo que ocupou aquele vale durante os dias do evento era muito simpático, pessoas que estão sorrindo para o mundo, e entregando-se a arte, a música e a natureza, independente de credo, cor, estilo, gênero e tudo mais. Enfim, gente que é gente, cheia de problemas é certo, mas com uma vontade de ser e viver plenamente, longe de etiquetas, rótulos e formalidades sociais. Distante dos olhos do ‘grande irmão’, o festival proporcionou aos participantes uma experiência singular, a de viver tolerantemente, respeitando as diferenças, cantando e dançando, correndo, dialogando, sorrindo... durante aqueles dias. Confesso, nunca havia presenciado tamanha tranqüilidade em eventos que envolvem música, bebidas, diversidades e tudo mais. Além da música, viam-se peças teatrais serem apresentadas ao ar livre, poesia beat e poetas psicodélicos recitando suas linhas malditas aos ouvintes, além das várias oficinas de arte espalhadas pelo vale. Pode-se dizer que naqueles dias, aquele vale psicodélico foi um mundo de paz, amor e arte, muita arte. Apesar de alguns problemas (o que é praxe acontecer em eventos musicais), poucos banheiros, pouca diversidade de alimentação e de cerveja, e falta de ambulância no local... o demais foi pura festa e contemplação. A chuva, iniciou já no segundo dia e não parou mais, o que causou certo transtorno, em contra partida refrescou e fez a festa dos que adaptam-se a acampamentos chuvosos, fazendo disso uma divertida estada. A música, atração principal do evento, fez ouvidos e alma sentirem profundamente. Seguramente posso dizer que foi, senão o mais, um dos mais espetaculares eventos musicais dos quais já estive presente. Nunca vi e ouvi tanta banda boa dividindo o palco.Na sexta, a banda de Curitiba: Vitrola Velha com seu ‘rock sessentista’ cheiro de energia e um baterista muito bom, fez viventes dançarem e cantarem. Dali para diante já não lembro mais dos dias e ordem das apresentações, e para não falar besteira, destacarei as bandas independente dos dias de apresentação, datarei somente as que tenho certeza. Assisti quase todas as apresentações, pois, quando cansado, subia outra boa banda no palco, aí era difícil sair dali. E foi assim até terça a tarde. Talvez não tenha visto umas 4 apresentações no máximo, as demais (que eram a maioria), vi todas, algumas não inteiras, pois as bandas não me chamaram tanta a atenção (talvez umas 4 apenas). Destaque para o rock de ótimos riffs e muito bem executado da banda paranaense O Sebbo, que me fez lembrar das musicas mais rock’s dos Mutantes e da fase setentista da banda ‘Joelho de Porco’. Uma das melhores apresentações do evento em minha opinião, destaque para o baterista ‘infernal’. Aliás, este evento foi dos bateristas, era difícil não percebe-los dando shows a parte. Outra grande banda foi a também paranaense Casa de Orates com seu espetáculo musical/teatral. Grande som, grande interpretações e estética... sem mais comentários: ‘do caralho!’. Gato Preto, banda de blues progressivo (se assim podemos chamar), também paranaense, proporcionou um verdadeiro espetáculo musical, sem exageros de minha parte, que foi viu e ouviu. O que era aquilo? Quanta técnica, aprimoramento, composições lindas. Banda cheia de virtuosismo mas sem se perder no ‘quadrado musical’ academicista. Destaque para o vocal, ator e flautista, que toca e canta ‘pra cara...’ - Lembrei de ‘Jethro Tull’ - (que andava as voltas vendendo cd’s de bandas independentes), para o baterista que me fez lembrar bandas como Rush, e o guitarrista e baixista que... enfim, não pode-se aqui descrever tamanha musicalidade, ótimo. A tão esperada Rollando Rock (SP-RS), do amigo e mestre nas baquetas e tambores Júnior (batera da ‘Patrulha do Espaço’), teve que apresentar-se por duas vezes. Fechando uma noite em que só iriam passar o som e apresentando-se novamente no dia seguinte, desta vez a tarde. Tocando clássicos da ‘Patrulha, Made in Brasil e Aeroblues’ (bandas que Júnior tocou e/ou toca), na noite a banda fez da passagem de som um show de rock, pois o público não parou de gritar até que a banda tocasse. E assim foi. Já na tarde seguinte, pudemos ver praticamente um show da ‘Patrulha’, sendo que, os integrantes desse projeto (figuras de São Leopoldo – RS) são músicos de rock a altura dos patrulheiros. Fizemos amizade com os caras, e além de bons músicos, são ‘gente finíssima’. Shows do cão, sem descrição. Júnior, desse não é preciso falar, o cara simplesmente é mestre e ‘senta o braço na batera’, fazendo de seu estilo um show aparte. Outra grande banda que faço questão de falar é a paranaense Seres Inteligíveis Vindos do Hiperurano. Sem o baterista ‘oficial’, a banda teve que pedir emprestado outro batera, que deu sim conta do recado. No início, percebia-se um nervosismo por parte da banda, pois não haviam ensaiado antes com aquele baterista. Mas logo, quando o batera improvisado (leia-se baterista do Gato Preto) demonstrou que isso não era um ‘problemão’, a banda fez seu show. Adorei a banda. Talvez a que mais gostei, não pela técnica ou apresentação e tal, mas pelas composições musicais... O que é isso gente?! Psicodelia na alma. Grande banda. Ouvindo melhor em casa: NOSSA! A tão esperada apresentação do mutante Sergio Dias, duvidada por muitos, realizou-se. Sem dúvida, belas músicas e grande show, mas naquelas alturas, já não definia-se tanta coisa, e a bela apresentação de ‘Serginho’ e sua ótima banda (destaque para a baterista - garota que demoliu os tambores... ‘do cão’!), estava a nível de outras tão boas quanto. O carisma do cara no palco, além do perfeccionismo, fez com que suas músicas fossem bem degustadas pelos ouvintes. Mas o ápice da apresentação foi quando foram tocadas as conhecidas pelo público: ‘Tudo foi feito pelo Sol’ e ‘Ao contrário de nada é nada’ (acho que é esse o nome), dos ‘Mutantes’ (essa última tocada duas vezes). Foi demais... Tivemos a oportunidade de um breve dialogo com o cara junto a Rollando, e ele me pareceu bem simpático. Canta e toca como nos discos, o cara é foda... Existem rumores que ano que vem, ele volte e traga consigo o irmão (Arnaldo Baptista) e outros mutantes mais... que tal? Outra banda que não posso deixar de destacar (e que proporcionou uma das apresentações mais empolgantes do evento), foi a banda instrumental curitibana Goya, do velho amigo e ex companheiro de banda Giva (batera – e síndico de nosso acampamento no Secos & Molhados), que junto ao saxofonista e flautista, ‘apavoraram’ em improvisos jazzísticos. Devido a falta do guitarrista, Goya com seu som experimental (sem medo de errar!), convidou um guitarrista que... ‘desgraça!’, deu show. O ‘carinha’ tocava muito! Subiram ao palco os também grandes guitarristas do ‘Rollando Rock’, numa bela participação. Ruídos psicodélicos, duelos de guitarra, soul music (leia-se funk e jazz), bateria swing, sax e flauta flutuantes, deram a apresentação um brilho, regada a muita energia e improviso. E por falar em flutuante, a banda alagoana Casa Flutuante fez uma bela apresentação, com canções emocionantes e bem executadas. Destaque para uma música feita com parceria do Pedrão do ‘Som Nosso de Cada Dia’ (grande banda brasileira dos anos 1970), e outra que eu particularmente gosto muito: ‘Imaginação’. Emocionante! Outra grande banda a proporcionar um grande show musical (principalmente para ‘músicos mais letrados’), foi a banda paranaense Sopro Difuso, com sua música ‘regionalista, progressiva, popular brasileira, com guitarras de rock’. Sei lá se assim pode-se definir uma banda tão diversa. O certo é que os caras tocavam muito. Algumas canções lembraram-me alguns grupos nativistas do RS e ‘Almôndegas’ (banda gaúcha dos anos 70). Para não me estender mais, destaque também para a apresentação da banda xapecoense Os Variantes, que mesmo tendo Faccio, vulgo ‘bolacha’ (vocal e baixista), nitidamente cansado, pelos dias de chuva e de rock, quase sem voz (o bicho não para de falar), fizeram uma das apresentações mais empolgantes do evento, levando a galera dançar e cantar, aplaudindo Xapecó pela marcante presença no evento, também saudada por Júnior na apresentação do ‘Rollando Rock’. E falando em presença, destaque para Willian (guitarrista), que com um estilo desprendido e próprio de tocar, recebeu até um beijo no rosto de um fã alucinado que subiu no palco.Talvez tenha esquecido de alguma banda que deveria destacar, mas ainda recupero-me do cansaço, da chuva, das caminhadas, das emoções, dos dias de rock e amizade... Êta povo mais tranqüilo! Nenhuma briga registrada num evento de mais de 3.000 pessoas... A esplendida vista da ‘Serra do Rio do Rastro’ e as belas apresentações musicais, já valeram o meu melhor carnaval até hoje, exemplo de paz, amizade, boa música, belas paisagens... Agora sim, se comprova, não devemos nada para os ‘gringos’ em termos de rock, não mesmo. Nem hoje, nem nunca. Só quem esteve e presenciou pode saber realmente. Enfim, a amizade existe! A boa música elétrica está a salvo! E o jovem, nem todo está perdido, como dizem alguns saudosistas por aí, assim como o rock, que ainda vive, em plenos anos 2000! Avante Psicodália, rumo a 2008...
* em breve fotos do evento e da serra...
Herman G. Silvani ou Niko, o mesmo.
Assinar:
Postagens (Atom)